sexta-feira, 26 de novembro de 2010

PARECER: “PODE O PORTADOR DE TITULO EXECUTIVO COM OBRIGAÇÃO CERTA, LÍQUIDA, EXIGÍVEL, OPTAR, AO INVÉS DA EXECUÇÃO POR QUANTIA CERTA, PELA COBRANÇA VIA MONITÓRIA?”

Espaço dedicado aos melhores pareceres elaborados pelos acadêmicos.

Acadêmica: Magali Delfes (FURB)

Trata-se de consulta formulada pelo Professor Fernando Henrique Becker Silva da Universidade Regional de Blumenau, a fim de esclarecer e apontar a solução dada pela Doutrina e pela jurisprudência sobre o questionamento proposto, qual seja, é possível a cobrança de obrigação certa, líquida e exigível através de Ação Monitória?

A fim de esclarecer a dúvida acima, mister tecer alguns comentários acerca do instituto da Ação Monitória, viabilizando assim, o entendimento da questão em análise.

É o Relatório

Em meio à busca pela efetividade do acesso à Justiça, através de soluções mais céleres das lides, muitas reformas foram introduzidas no sistema processual. Uma delas, com a “Reforma do Código de Processo Civil”, especificamente nos idos de 1994 e 1995, quanto à praticidade na efetivação do direito pela via do processo e sua celeridade.

Neste contexto - alterado pela lei n.º 9.079/95 - o atual Código de Processo Civil prevê a aplicação da ação monitória somente nas obrigações de pagar soma em dinheiro, entregar coisa fungível ou determinado bem móvel, nos termos do art. 1.102-A, o qual se transcreve:

“A ação monitória compete a quem pretender, com base em prova escrita e sem eficácia de título executivo, pagamento de soma e dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel.”

A ação monitória foi introduzida em nosso ordenamento jurídico com o escopo de conferir maior celeridade processual às causas onde se busca a tutela jurisdicional para constituição de título executivo fundado em prova escrita, na qual resta materializada obrigação de dar quantia certa, ou entregar coisa fungível ou bem móvel.

Assim, temos que a ação monitória é o meio competente a quem pretender, fundado em prova escrita sem eficácia de título executivo, o pagamento de soma em dinheiro, entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel.

Estando a petição inicial devidamente instruída, conforme requisitos do artigo 282 do Código de Processo Civil, o juiz deferirá de plano a expedição do mandado de pagamento ou de entrega da coisa no prazo de quinze dias. Em igual prazo, isto é, nos quinze dias, poderá o réu oferecer embargos, que suspenderão a eficácia do mandado inicial.

Caso não haja oposição de Embargos, constituir-se-á, de pleno direito, o título executivo judicial, convertendo-se o mandado inicial em mandado executivo. Cumprindo o réu o mandado, ficará isento de custas e honorários advocatícios. Os embargos independem de prévia segurança do juízo e serão processados nos próprios autos, pelo procedimento ordinário. Rejeitados os embargos, constituir-se-á, de pleno direito, o título executivo judicial, intimando-se o devedor e prosseguindo-se na forma prevista no Livro I, Título VIII, Capítulo X do CPC. Veja Arts. 1.102 A a 1.102 C do Código de Processo Civil e Lei n° 9.079/95.

Quanto ao seu conceito etimológico, ensina Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, o termo "monitório" originário do latim monitoriu, significa: que adverte, repreende ou admoesta; monitorial.

Na lição de José Rogério Cruz e Tucci, a ação monitória:

Consiste no meio pelo qual o credor de quantia certa ou de coisa determinada, cujo crédito esteja comprovado por documento hábil, requerendo a prolação de provimento judicial consubstanciado, em última análise, num mandado de pagamento ou entrega de coisa, visa obter a satisfação do seu direito [...] o procedimento monitório é recomendado para litígios que não contenham questões de alta indagação, vale dizer, para aqueles em que a matéria contenciosa seja relativamente simples, como, e.g., a cobrança de honorários por profissionais liberais; a cobrança fundada em extratos autênticos de livros contábeis, ou em títulos cambiais que, dado carecerem de um requisito formal ou por estarem prescritos, não ostentam eficácia executiva; etc.

NELSON NERY JUNIOR conceitua o procedimento em análise, como:

O instrumento processual colocado à disposição do credor de quantia certa, de coisa fungível ou coisa móvel determinada, com crédito comprovado por documento escrito sem eficácia de título executivo, para que possa requerer em juízo a expedição de mandado de pagamento ou de entrega da coisa para a satisfação de seu crédito.

Frederico Ricardo de Almeida Neves (1996, p. 22) ensina que:

A finalidade precípua do novel instituto de direito processual acha-se bem definida na lei e consiste em simplificar o acesso do credor ao título executivo, estabelecendo uma verdadeira inversão quanto a iniciativa do contraditório”.. em página seguinte, assevera e conclui : “é iniludível a característica cognitiva do procedimento recém criado.”

Relativamente a sua natureza jurídica, NELSON NERY JUNIOR assevera que a ação monitória:

[...] é ação de conhecimento, condenatória, com procedimento especial de cognição sumária e de execução sem título. Sua finalidade é alcançar a formação de título executivo judicial de modo mais rápido do que na ação condenatória convencional. O autor pede a expedição de mandado monitório, no qual o juiz exorta o réu a cumprir a obrigação, determinando o pagamento ou a entrega de coisa fungível ou de determinado bem móvel. Trata-se, portanto, de mandado monitório, cuja eficácia fica condicionada à não apresentação de embargos. Não havendo oposição de embargos, o mandado monitório se convola em mandado executivo.

Sobre o tema proposto, e com fundamento no que foi acima esclarecido, conclui-se então que a ação monitória destina-se à constituição de título executivo e, se for o caso, à sua posterior execução.

A propósito, eis a distinção – de forma sucinta – entre Execução e Ação Monitória:

A característica fundamental do processo de execução é a não incidência do contraditório, porquanto existe a presunção de certeza, liquidez e exigibilidade que embasa o título executivo, tendo em vista o processo cognitivo, ou em razão da própria lei, conforme se infere da leitura do art. 585, do Código de Processo Civil, in verbis:

Art. 585 - São títulos executivos extrajudiciais:

I - a letra de câmbio, a nota promissória, a duplicata, a debênture e o cheque;

II - a escritura pública ou outro documento público assinado pelo devedor; o documento particular assinado pelo devedor e por duas testemunhas; o instrumento de transação referendado pelo Ministério Público, pela Defensoria Pública ou pelos advogados dos transatores;

III - os contratos de hipoteca, de penhor, de anticrese e de caução, bem como de seguro de vida e de acidentes pessoais de que resulte morte ou incapacidade;

IV - o crédito decorrente de foro, laudêmio, aluguel ou renda de imóvel, bem como encargo de condomínio desde que comprovado por contrato escrito;

V - o crédito de serventuário de justiça, de perito, de intérprete, ou de tradutor, quando as custas, emolumentos ou honorários forem aprovados por decisão judicial;

Vl - a certidão de dívida ativa da Fazenda Pública da União, Estado, Distrito Federal, Território e Município, correspondente aos créditos inscritos na forma da lei;

Vll - todos os demais títulos, a que, por disposição expressa, a lei atribuir força executiva.

§ 1º - A propositura de qualquer ação relativa ao débito constante do título executivo não inibe o credor de promover-lhe a execução.

§ 2º - Não dependem de homologação pelo Supremo Tribunal Federal, para serem executados, os títulos executivos extrajudiciais, oriundos de país estrangeiro. O título, para ter eficácia executiva, há de satisfazer aos requisitos de formação exigidos pela lei.

Prosseguindo, determina o artigo 586 que “A execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título líquido, certo e exigível.”

Por outro lado, há o título injuntivo, qual seja, aquele desprovido de força executiva, mas que merece receber a tutela diferenciada, em razão da desnecessidade de dilação probatória que a fundo se tornaria exaurinte e de simplicidade de situação fática.

Em decorrência de situações como esta acima, é que o legislador pátrio inseriu em nossa legislação a Ação Mandamental, o que a distingue da Ação de Execução, posto que, aquela tem por objetivo precípuo a satisfação do título ou da obrigação, que já é dotada de certeza, exigibilidade e liquidez, e este, o conhecimento sumário, inclusive com o contraditório, mesmo que eventual, para após, a certeza e liquidez, ou seja, a cognição do título, o exigir através de execução.

Neste sentido, colaciona-se o seguinte julgado, o qual transcreve-se em partes:

“[...] a finalidade de constituir título de crédito com força executiva quando ao documento comprobatório da dívida falta esse requisito, mediante a expedição de mandado de pagamento ou de entrega de coisa, com o estabelecimento de prazo para o cumprimento da obrigação ou a oposição de embargos [...] A sua finalidade é, portanto, conferir força executiva a documento que por si não a tenha, e não a de revalidar título de crédito suscetível de ser cobrado pela via executiva e que tenha perdido tal força pela prescrição.” “Se admissível com essa finalidade, a ação monitória transformará em letra morta o instituto de prescrição da cambial, uma vez que ela poderia ser afastada em qualquer caso, perpetuando o direito do credor negligente ou omisso contra o devedor. “Trata-se (conclui o acórdão) de pedido juridicamente impossível.” (grifei, 7ª Câmara Cível do Tribunal de Alçada de Minas Gerais, no julgamento da Apelação Cível n. 0239251-6)

Conclui-se então que o que caracteriza o título injuntivo é o desprovimento de eficácia executiva. Falta-lhe, pois, a exigibilidade para ensejar a Ação de Execução, porquanto se presume existir certeza e liquidez. Significa dizer que a Ação Monitória é cognitiva e sua decisão constitutiva, buscando tão somente conferir ao título injuntivo a característica que lhe falta, isto é, a exigibilidade.

O autor João Batista Lopes é categórico ao afirmar que, “não cabe ação monitória, por falta de interesse, existindo título executivo que autorize desde logo a execução”.

Eis a Fundamentação

CONCLUSÃO

Diante de tudo o que foi exposto, é possível concluir o seguinte raciocínio a fim de sanar o questionamento proposto, o que se faz da seguinte forma:

Em primeiro lugar, do estudo acerca da Ação Monitória constatou-se que o novel instituto foi introduzido na legislação processual civil pátria com a finalidade precípua de simplificar o acesso do credor ao título executivo e seu fim específico é a formação do título executivo e o objeto do pedido, em primeiro plano, é de recebimento coativo da dívida; logo, de execução.

Por outro lado, determina o artigo 586 do Código de Processo Civil que a execução para cobrança de crédito fundar-se-á sempre em título líquido, certo e exigível.

Partindo destas duas premissas, infere-se a seguinte conclusão: se a ação monitória tem como finalidade justamente a formação do título que não tem força executiva e a ação de execução exige uma obrigação já certa líquida e exigível, o meio adequado para o credor de obrigação líquida certa e exigível é a Execução, e não a Ação Monitória, eis que não há razão de utilizar tal procedimento se o título ou obrigação já possui o requisito da exigibilidade, este que é o que se busca com a Ação Monitória.

Então, estando o credor com documento que possui efeitos executivos, não poderá optar entre a via executiva e monitória, pois será carecedor de ação se requerer a satisfação de seu crédito através da via monitória, já que o Código de Processo Civil reservou procedimento próprio àqueles que possuem título executivo (ação de execução).

É o meu parecer.

 
REFERÊNCIAS

 
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. São Paulo: Editora Nova Fronteira, 2004.

LOPES, João Batista. Revista de Processo. São Paulo, (106): 28-37, abri-jun/2002.

NERY JUNIOR, Nelson. Atualidades sobre o processo civil. 2a ed., São Paulo: Malheiros, 1996, p. 226-227.

NERY JUNIOR, Nelson & NERY, Rosa Maria Andrade. Código de Processo Civil Comentado e Legislação Processual Civil Extravagante em vigor. 4. ed., São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1999, pg. 1.375.

NEVES, Frederico Ricardo de Almeida. Breves Comentários sobre a Ação Monitória. 1ª Edição. Recife: Editora Nossa Livraria, 1996

TUCCI, José Rogério Cruz e. Ação Monitória. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1995.

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